Em um episódio da série de TV Seinfeld, um personagem chamado George está comendo uma grande quantidade de camarão durante uma reunião de trabalho. Seu colega, Reilly, brinca: “Ei George, o oceano ligou! Estão ficando sem camarão.” George fica um pouco sem reação para responder, por estar participando da reunião, mas depois pensa na resposta perfeita: “Bem, a Loja de Idiotas ligou e falaram que você está em falta”.
Os franceses têm um ditado para o dilema de George – l’esprit de l’escalier, ou em tradução livre para o português: “espírito da escada”. Isso se refere a quando você pensa em uma resposta ideal para alguém, mas só depois de ter saído da sala e descido as escadas.
Como estudiosos de diversidade e inclusão, frequentemente ouvimos pessoas que vivenciaram o “espírito da escada” em situações muito mais sérias e consequentes do que o incidente envolvendo o camarão de George. Especificamente, o espírito da escada muitas vezes ocorre em resposta a comportamentos não inclusivos no trabalho. Como, por exemplo, você está em uma reunião, seu colega faz um comentário “casualmente” racista (ou sexista, ou homofóbico), e todo mundo, inclusive você, fica lá em silêncio atordoado, sem saber o que dizer até que seja tarde demais.
Felizmente, situações em que é realmente tarde demais para intervir são raras. Na verdade, pode ser bom esperar, reunir seus pensamentos e entender os sentimentos em particular quando as emoções – e a cabeça – esfriarem. Mas todos nós já estivemos em situações em que é necessário falar na hora. Talvez aquela fala ou ação seja muito grave para ser ignorado, ou talvez ocorra na frente de outras pessoas e precise ser abordado naquele momento pra evitar que a situação se repita.
Nessas circunstâncias, pessoas aliadas precisam de uma certa ajudinha pra encontrar as palavras certas. Em um estudo do psicólogo Larry Martinez e colegas, uma aliada da causa LGBTQIA+ (Nicole) relatou aos pesquisadores: “Às vezes, já estive em uma conversa em que pensei: “Ah, essa é uma boa oportunidade pra falar algo'”. No entanto, ela tentaria descobrir o que dizer e perderia o momento, pensando: “Putz! Estraguei tudo. Deveria ter dito alguma coisa”. De acordo com os pesquisadores, a experiência de Nicole é comum. As pessoas entrevistadas eram “raramente confiantes” e muitas vezes não conseguiam confrontar situações preconceituosas ou responder a comentários ofensivos mesmo quando queriam fazê-lo.
Em nosso trabalho conjunto no Meltzer Center for Diversity, Inclusion, and Belonging na Faculdade de Direito da NYU, ensinamos a pessoas de todas as origens como ter conversas melhores sobre questões de identidade e diversidade. Com muito medo de errar, várias pessoas pediram por um roteiro: “Apenas me fale o que dizer que eu falo!” Normalmente, recusamos, porque roteiros podem transformar interações naturais em performances um pouco engessadas. É melhor dar às pessoas princípios gerais e deixá-las descobrir por conta própria como dizer o que querem dizer.
Mas nessas circunstâncias específicas, pensamos em flexibilizar nossa própria regra por duas razões. Primeiro, quando um colega faz um comentário tendencioso, a situação geralmente parece tensa, o que torna mais provável que você fique paralisado ou não consiga dar a resposta que quer. Segundo, como observamos, às vezes uma resposta imediata é necessária – você não quer deixar um comentário tendencioso ou preconceituoso pairar no ar. Por esses motivos, é útil ter algumas respostas preparadas prontas.
Dicas de como responder a comentários preconceituosos
Para lhe dar opções, construímos essa lista com alguns itens do nosso próprio trabalho e alguns do trabalho de outros escritores e acadêmicos, incluindo Karen Catlin, Dolly Chugh e Diane Goodman, que tem sido uma ferramenta útil para muitas pessoas:
- Diga algo curto e direto, como: “Eita!” ou “Nossa…”
- Enfatize o impacto que aquilo teve em você: “Não gostei desse comentário, porque …”
- Mostre como suas opiniões mudaram: “Eu costumava concordar com sua opinião, mas mudei minha percepção quando…”
- Afirme os valores da pessoa que está te dizendo isso: “Eu sei que você se preocupa com_______, mas o que você acabou de dizer não parece ser conivente com isso.”
- Afirme quais quais são as intenções do que a pessoa está dizendo: “Embora eu tenha certeza de que você não quis dizer isso dessa maneira, eu achei ofensivo.”
- Conecte a frase ou expressão a pessoas específicas: “Eu tenho uma amiga que pertence a essa comunidade. Minha experiência com ela é diferente do que você descreveu.”
- Apele aos valores das empresa: “Como líder da equipe, é minha responsabilidade manter uma cultura inclusiva, então preciso comentar sobre o que você acabou de dizer.”
- Eduque: “Acabei de ler um ótimo artigo sobre esse tópico. Posso enviar para você?”
- Mostre o que eles poderiam ter dito: “Acho que o cliente realmente vai gostar dela” (em resposta a um erro de gênero, por exemplo).
- Peça para explicar suas opiniões: “Eu não entendi essa piada. Você pode me explicar?” \
- Repita o que eles disseram: “Para garantir que ouvi corretamente, você acabou de dizer _____?”
Claro que, algumas dessas frases só funcionam em casos particulares. Por exemplo, “Eita!” ou “Nossa” soa melhor quando quer ganhar mais tempo para pensar no que mais dizer, mas é menos apropriado quando você está tentando ajudar a pessoa a aprender com seu erro. O ponto aqui não é escolher uma única palavra ou frase que funcione em todas as situações, mas ter algumas expressões na ponta da língua pra usar conforme necessário.
Outro ponto importante é de você se certificar de escolher frases que combinem com sua personalidade e jeito de falar naturalmente. Seu estilo é mais direto ou indireto? Você é mais do tipo de pessoa que gosta de educar ou prefere indicar conteúdos? Todos nós temos personalidades analíticas e que não preferem uma espécie confronto, o que pode levar a fazer perguntas ou compartilhar feedback de uma forma um pouco mais paciente.
Se as sugestões não fazem sentido com você, sempre é possível criar sua própria maneira de responder a esses comentários. A melhor forma para isso é experimentar encontrar palavras que soem mais naturais ao seu vocabulário e se comprometer com frases que são da sua preferência.
Na próxima vez que um colega de trabalho ou mesmo um cliente disser algo ofensivo, ter algumas frases preferidas na memória, com certeza pode te ajudar a fazer uma intervenção na hora certa, naquele momento da reunião, em vez de fazer isso sozinho(a), na escada.
Tradução adaptada do texto “How to respond when a coworker says something offensive“, de Kenji Yoshino e David Glasgow, professores de Direito da Universidade de Nova York